sexta-feira, novembro 24, 2006

Todos juntos contra a AIDS

O século passado foi marcado, em termos epidemiológicos, pela grande explosão da AIDS. Em consequência, o final do século 20 e o início do 21, foram marcados pela grande quantidade de planos para conter a expansão da doença.

Felizmente, há, hoje, na sociedade, um consenso: todos estão contra a AIDS. Vamos analisar os meios dos diferentes atacantes:

Canadá:







AIDS is still around. AIDS ainda está por aí.

A propaganda é baseada em imagens, com tons preto-e-branco para demonstrar melancolia do doente. Definitivamente, vai direto ao ponto. Retrata que a transmissão de AIDS acontece tanto nas relações homossexuais como nas heterossexuais. E, claro, no uso de drogas injetáveis e seringas compartilhadas. A ausência do sexo oral nas imagens pode ser explicada pelos insossos dados relativos a transmissão de AIDS por esse meio:
"As evidências sugerem que o sexo oral parece ser a forma menos arriscada para a transmissão do HIV. Entretanto, parcerias homossexuais e heterossexuais normalmente realizam sexo oral conjuntamente com sexo genital e, assim, não é possível comparar-se os riscos desses dois tipos de atividade sexual. Isoladamente, o risco da transmissão pelo sexo oral pode ser aumentado na vigência de inflamação ou ulceração na boca, na vagina ou no ânus" Ref. 1
Sendo assim, não podemos criticar isto na campanha. O bom da campanha é que ela é um tanto quanto leve, não traz impacto direto (não criando oponentes diretos), muito por serem lápides e pelo elemento causador da melancolia, já citado. A data (1981) não foi solta ao acaso: Nesse ano foram feitos os primeiros diagnósticos da, na época, GRID (Gay Related Immuno Deficiency, atualmente AIDS). A relação com o homossexualismo se dava pelo surgimento dos casos apenas em homossexuais, gerando distúrbios de pele comuns apenas na 3ª idade. A frase vem para lembrar que, mesmo com todo o mundo avançando, a AIDS está por aí. Nota-se um certo remetimento ao passado, visto que lápides tão vistosas estão, pelo menos no Brasil, fora de moda - e de viabilidade econômica. Portanto, a propaganda faz a ponte entre o passado e o presente: a AIDS.

França:





Sans preservatit, c'est avec le sida que vous faites l'amour. Protegez-vous. Sem preservativo, é com a AIDS que você faz amor. Proteja-se.

Definitivamente, o impacto dos franceses é muito maior. A propaganda utiliza de ambientes claros para dar realce à cena em primeiro plano. O uso de pessoas reais deixa tudo mais próximo a nós: pessoas de carne e osso sofrem com isso. Os Aracnídeos estão presentes graças a comum repulsa por esses Artropodes, comumente venenosos. Ou não? Muitos criticaram a propaganda pela escolha e colocação dos animais. Normalmente, "aranha" (por motivos óbvios) está relacionado com a mulher e o escorpião (por motivos mais óbvios ainda) está relacionado com o homem. Logo, tal propaganda deixaria subentendido que a AIDS só é problema para os homossexuais (Ref. 2). Uma defesa para a propaganda é que, com o escorpião virado com o ventre para o homem, seria (pensando na anatomia humana) impossível - em teoria - uma relação homossexual. A frase explica a propaganda, o inimigo com quem fazemos sexo, quando desprotegido, é a AIDS. Ao contrário da primeira, o sexo oral foi colocado aqui, deixando de lado o uso de drogas injetáveis, ato falho - visto que o segundo é vetor muito mais perigoso da doença. Finalizando, a propaganda deixa a entender que as francesas não usam nada por baixo: a calça do excitado rapaz está na parte inferior da foto, mas, cadê a calcinha da moça?

Brasil - Governo:



A propaganda atende a vários pontos: combate o preconceito, promove o uso de métodos para evitar a transmissão de AIDS e, ainda por cima, dá a idéia de que os homossexuais tinham uma relação estável (Leia-se namoro), portanto não levavam uma vida promíscua, na qual a transmissão da AIDS é facilitada. Só faltou a lembrança da transmissão heterossexual e pelo uso de drogas injetáveis.

Brasil - ONGs:



A propaganda é toda tenebrosa e é, desculpem, ridícula. A idéia não é combater a AIDS? Eles preferiram combater a instituição Igreja Católica. Não é educativa, afinal não fala nada da doença. Vamos tratar disso na sequência.

Igreja Católica:

Depois do vídeo, "Calma aí", você diria. A Igreja Católica apregoa que ninguém use camisinha! Isso é um pensamento retrógrado que propicia a transmissão de AIDS. Certo. Porém ela apregoa, também, que todos devemos ter um parceiro, não devemos ser promíscuos nem trocar de parceiro como se troca de roupa. Definitivamente, o melhor método de prevenção da AIDS e de qualquer outra doença sexualmente transmissível. Mas será que o "Duda Mendonça" do Vaticano não anda pisando na bola? Vamos ter como base a "Carta às Famílias do Brasil", de Dom Rafael Llano Cifuentes (Ref. 3), e alguns trechos, a serem citados, dela.
"(...)a feição que tem as propagandas que às vezes aparecem: “aproveite o carnaval, mas use ‘camisinha’”. Aceita-se um pressuposto inadequado – a promiscuidade – e inclusive incentiva-se a mesma: “não se iniba, divirta-se, mas – cuidado! – use ‘camisinha’”. " Ref. 3
Primeiro e maior erro dos pontífices: ao invés de corroborar com a própria causa, preferem criticar o "inimigo", igualando-se a propaganda anterior (à qual a carta de Cifuentes é um ataque). Igual ao segundo turno presidencial do Brasil: Lula dizia que Alckmin era privatista e esse, por sua vez, dizia que Lula era ladrão. Ninguém tentava mostrar que era melhor que o outro, mas sim que o outro era pior que ele próprio. O segundo trecho da carta - "Esclarecimentos necessários" - só serve para criticar as propagandas pró-camisinha, assim como o texto com um todo.
"Pode-se, intelectualmente, ser favorável às relações sexuais pré-matrimoniais, mas ninguém gosta que uma filha de quinze anos fique grávida, ou que um filho de quatorze anos seja pai." Ref. 3
Aí a crítica a camisinha é misturada com um dogma da igreja católica: não se pode realizar o planejamento familiar mantendo as relações sexuais, seja em matrimônio ou não: nem todos que fazem sexo com 14/15 anos vão engravidar. Isso é questão de educação (sexual).

O grande erro da Igreja Católica é se preocupar mais em criticar a camisinha do que em disseminar os hábitos de fidelidade e monogamia, saudáveis e excepcionais no combate a AIDS. Portanto, quem peca aqui não é quem usa camisinha ou não, e sim a Igreja, que tem o trunfo na mão e não auxilia a população como deveria.

Uganda:

Uganda é o único caso de sucesso absoluto conhecido. Veja o gráfico:


Ele mostra a Porcentagem estimada da população com AIDS no decorrer dos anos. O programa de Uganda se baseia em seguir três simples atos, em conjunto ou não:
  1. Abstinência
  2. Fidelidade
  3. Preservativos
Mais ou menos nessa ordem. Para um país africano que tinha níveis de aidéticos superiores a 30% da população, uma atitude acertadíssima. Eu reciclaria o programa para o Brasil colocando a Fidelidade em primeiro lugar, seguida pela abstinência e pelos preservativos, em mesmo plano. Veja algumas imagens lá publicadas:

Ref. 5

Vê-se que a abordagem trata primeiro de suscitar a conversa sobre a doença, para, aí sim, abordar temas como abstinência, fidelidade e preservativos.

Agora, a pergunta é: por que nenhum país, até agora, copiou o plano, funcional, de Uganda? A camisinha, isolada, não está fazendo um bom trabalho em local algum, tanto na África como no resto do mundo. Custaria tentar salvar a vida de milhares de pessoas e, de quebra, re-estabelecer os laços da instituição família, ou diminuir a promiscuidade com que convivemos? Acho que não. Alguém não quer dar o braço a torcer de que a camisinha, só, falhou.

Referências:

Ref. 1: FUNARI, Sergio Luis.
Sexo oral e HIV entre homens que fazem sexo com homens. Disponível em: scielo.br/pdf/csp/v19n6/a28v19n6.pdf . Consulta dia 24 de Novembro de 2006.

Ref. 2: onda corta. Sida a la francesa. Disponível em: zuri-yiyo.blogspot.com/2006/04/sida-la-francesa.html. Consulta dia 24 de Novembro de 2006.

Ref. 3: CIFUENTES, Dom Rafael Llano. Carta às Famílias do Brasil: A educação afetiva e sexual dos filhos e o uso do preservativo como inibidor da AIDS. Disponível em: portaldafamilia.org/artigos/artigo207.shtml. Consulta dia 24 de Novembro de 2006.

Ref. 4: AVERT. HIV & AIDS in Uganda. Disponível em: avert.org/aidsuganda.htm. Consulta dia 26 de Novembro de 2006.

Ref. 5: Human Rights Watch. Reprinted from the Ministry of Education and Sports, PISACY, Helping Students Stay Safe, © Ministry of Education and Sport 2003. Disponível em: hrw.org/campaigns/aids/2005/uganda/photos/index.htm. Consulta dia 26 de Novembro de 2006.

Creative Commons License
O conteúdo deste post está licenciado sobre uma Licença Creative Commons.